31 de ago. de 2011

CADINHO E PENEIRAS

A palavra de Deus e a do homem.

A palavra de Deus é um cadinho.


O que ela cria, derrete e funde em um todo, nada aceitando como valioso, nada rejeitando como
sem valor. Possuindo o Espírito de Compreensão, sabe muito bem que ela e a sua criação constituem um todo; que rejeitar uma é rejeitar tudo; que rejeitar o todo é rejeitar-se a si mesmo. Consequentemente, ela tem para sempre o mesmo objetivo e o mesmo sentido.

Entrementes, é como uma peneira a palavra do Homem. O que ela cria, prende e expulsa. Está
sempre tornando isto como amigo e expulsando aquilo como inimigo. Mas freqüentemente o amigo de
ontem torna-se o inimigo de hoje; o inimigo de hoje, o amigo de amanhã.

E assim se desencadeia a cruel e inútil guerra do Homem contra si mesmo. Tudo porque falta ao
Homem o Espírito Santo, o único que pode fazê-lo compreender que ele e a sua criatura são uma e
mesma coisa; que expulsar o adversário é expulsar o amigo, pois ambas as palavras - "adversário" e amigo" - são criações de sua palavra - de seu eu.

Aquilo de que não gostais e atirais fora como sendo mau, é certamente apanhado por alguém ou
algo como sendo bom. Pode acaso ser, ao mesmo tempo, duas coisas que se excluam? Ela não é nem
uma coisa nem outra, foi o vosso eu que a fez má; outro eu a fez boa.
Não vos disse que aquele que pode criar pode também destruir? Tal como criastes um inimigo,
podeis destruí-lo e tornar a criá-lo como amigo. Para isso o vosso eu precisa ser um cadinho. Para isso necessitais ter o Espírito de Compreensão.

Por isso vos digo que se orais por algo, orai em primeiro e último lugar pedindo Compreensão.
Nunca sejais peneiradores, meus companheiros, pois a Palavra de Deus é Vida e a Vida é uma cadinho no qual tudo se faz uno e indivisível; tudo fica em perfeito equilíbrio e tudo é digno de seu autor - A Triunidade Santa. Quanto mais digno deve ser de ti! Nunca sejais peneiradores, meus companheiros, e tereis uma tão imensa estatura, tão onipenetrante e tão oniabrangedora que não haverá peneiras que vos possam conter. Nunca sejais peneiradores, meus companheiros; procurai em primeiro lugar o conhecimento d'A Palavra para que possais conhecer a vossa própria palavra. E quando souberdes a vossa palavra lançareis ao fogo todas as vossas peneiras, pois a vossa palavra e a de Deus são a mesma, somente que a vossa ainda está sob os véus. Mirdad vos pede que jogueis fora os véus.

A Palavra de Deus é o Tempo e o Espaço não medidos. houve acaso algum tempo em que não estivésseis com Deus? E há algum lugar em que não estejais em Deus? Por que acorrentais, então, a eternidade com horas e com estações? E por que encerrais o Espaço em polegadas e milhas?
A Palavra de Deus é Vida não nascida e portanto imortal.

Porque é a vossa, então, obstruída com o nascimento e a morte? Não estais vós vivendo unicamente a vida de Deus? E pode o Imortal ser a causa da Morte?
A Palavra de Deus inclui o Todo. Nela não há cercas nem barreiras. Porque está a vossa obstruída
com cercas e barreiras?

Digo-vos que vossa própria carne e vossos próprios ossos não são somente vossos. Inumeráveis
são as mãos que com as vossas mergulham nos eternos depósitos da terra e do céu, de onde vêm a para onde voltam os vossos ossos e a vossa carne. Nem é a luz de vossos olhos somente vossa. Ela é bem a luz de todos os que convosco compartilham o sol. Que poderiam os vossos olhos contemplar nos meus se não fosse a luz dos meus? É a minha luz que me vê em nossos olhos. É a vossa luz que vos vê em meus olhos. Fosse eu uma perfeita treva e os vossos olhos, contemplando-me, só veriam uma perfeita treva. Nem é o vosso alento em vosso peito somente vosso. Todos aqueles que respiram ou já respiraram o ar estão respirando o vosso alento. Não é o alento de Adão que ainda pulsa em vossos corações? Nem são os vossos pensamentos somente vossos. O mar dos pensamentos os reclama como a ele pertencentes, e assim também o fazem os seres pensantes que compartilham convosco esse mar. Nem são os vossos sonhos somente vossos. Todo o universo está sonhando os vossos sonhos. Nem são as vossas casas somente vossas. Elas são também a habitação do vosso hóspede, da mosca, do rato, do gato, bem como de todas as criaturas que compartilham a casa convosco. Cuidado, pois com a cercas. Quando cercais, pondes a Decepção para dentro delas e a Verdade para fora. E quando vos voltais para vos verdes para dentro da cerca encontrais-vos face a face com a Morte, que é a Decepção com outro nome. Inseparável de Deus, ó monges, é o Homem. Inseparável, pois dos semelhantes e das criaturas provenientes da Palavra.

A Palavra é o oceano, vós sois as nuvens. E a nuvem não é nuvem pelo que do oceano contém? E
na verdade seria tola a nuvem que desperdiçasse a sua vida para se firmar no espaço tentando manter eternamente a sua forma e a sua identidade. Que resultado colheria dessa tolice senão esperanças desfeitas e uma vaidade amarga? A não ser que se perca, não se poderá achar. A não ser que morra e desapareça como nuvem, não poderá encontrar o oceano que tem em si e que é o seu único ser. O Homem é uma nuvem que contém Deus em si. A não ser que se esvazie a si mesmo, não
poderá encontrar-se. E que alegria a de esvaziar-se!

A não ser que vos percais para sempre na Palavra, não podereis compreender a palavra que está
em vós - o vosso eu. Ah! a alegria de perder-se!
Mais uma vez vos digo, orai pedindo Compreensão. Quando a Sagrada Compreensão penetrar em
vossos corações nada haverá na imensidade de Deus que não vibre para vós uma alegre resposta todas as vezes que pronunciardes EU.

E então a própria Morte porá em vossas mãos a arma com a qual vencereis a Morte. E então a Vida colocará nos vossos corações a chave do seu coração sem limites, a chave dourada do Amor.

Shamadam: Nunca sonhei que tanta sabedoria pudesse ser espremida de um pano de pratos e de uma vassoura (aludindo à posição de Mirdad como servo).

Mirdad: Tudo é fonte de sabedoria para o sábio. Para aquele que não é sábio a própria sabedoria é loucura.

Shamadam: Tens uma língua hábil, sem dúvida. É de se admirar que a tenhas freado por tanto tempo; se bem que as tuas palavras são muito duras de se ouvir.

Mirdad: Minhas palavras são macias, Shamadam. É o teu ouvido que é duro. Infelizes daqueles que, ouvindo, não ouvem e, vendo, não vêem. ida colocará nos vossos corações a chave do seu coração sem limites, a chave dourada do Amor.

Shamadam: Nunca sonhei que tanta sabedoria pudesse ser espremida de um pano de pratos e de uma vassoura (aludindo à posição de Mirdad como servo).

Mirdad: Tudo é fonte de sabedoria para o sábio. Para aquele que não é sábio a própria sabedoria é loucura.

Shamadam: Tens uma língua hábil, sem dúvida. É de se admirar que a tenhas freado por tanto tempo; se bem que as tuas palavras são muito duras de se ouvir.

Mirdad: Minhas palavras são macias, Shamadam. É o teu ouvido que é duro. Infelizes daqueles que, ouvindo, não ouvem e, vendo, não vêem.

Shamadam: Eu ouço e vejo muito bem. Não ouvirei, no entanto, essa loucura de que Shamadam é o mesmo que Mirdad; de que o mestre e o servo são iguais.


Fonte: Cap. 5 de "O Livro de Mirdad" de MIKHAIL NAIMY - Baixá-lo aqui


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